Falsa americana

Por Diogo Mendes


Tela com tela. Mais de cinco meses teclando e tudo se resume em esperar o desembarque no aeroporto.

- Vai estar de oliva, ainda bem que não escolheu uma cor comum – falava sozinho o homem de trinta anos – será que vai gostar de mim?

Nervoso decidiu comprar algo para espantar a fome. Dentro da cafeteria assistia pela vitrine, ao espetáculo guloso das guloseimas, tentando mentalmente ensaiar uma frase de impacto.

- O senhor vai querer alguma coisa - interrompe o atendente da loja - já decidiu?
- Sim, vou.... Me vê um cafezinho.
- Médio ou grande?
- O pequeno não sou tão fã de cafeína.
- Não temos o copo pequeno, por isso disse: médio ou grande.
- Como não tem?
- Ainda não foi hoje distribuído, senhor...
- Tudo bem, não quero problema. Me vê o médio.
- Como?
- Por fim.... Me vê o café médio.
- Agora entendi...

O atendente demorou uns instantes e a ansiedade ficou mais visível no homem que tomou o café em uma golada. Enquanto mal se virava o funcionário do estabelecimento perguntou com certa arrogância:

- Vai querer mais alguma coisa?
- Sim, mas depois.

Hora do encontro e ele saiu com rapidez. Outro avião, provavelmente, descia. Ele tremia dentro das roupas compradas em cinco prestações. Planejava apelar para o humor e conseguir simpatia imediata.

- Parece que é ela!

Decidiu aumentar os passos à medida que se lembrava do rosto conhecido através das telas, até abordar uma mulher de oliva que entrou no saguão.

- Oi... Está me reconhecendo?
- Olá, não. Deveria reconhecer?
- Desculpa foi engano.

Voltou envergonhado perto do local que estava, nervoso, lembrou outra vez dos contornos do rosto tão familiar, viu outra mulher de oliva.
Arrisca.
Risca.
Arriscado.

- Oi!
- Tudo bem! – afirmou a mulher sem nenhum problema de pronúncia – você é como imaginava...
- Oi Emily! Você, também estou muito contente de te conhecer ao vivo.

Os dois se abraçam e passearam pelas lojas do aeroporto. Ele disfarçava a curiosidade sobre a falta de sotaque da americana. Em uma revistaria folheando uma publicação de curiosidades tomou coragem.

- Emily?
- Sim...
- Como você apreendeu a Língua Portuguesa tão rápida?
- Antes que eu saia com você do aeroporto preciso de contar uma verdade...
- Não estou te entendendo. Como?
- Não sou a pessoa esperada por você. Nunca te vi na vida!

Ela colocou de maneira brusca a revista de variedades no mostruário. No momento, entretanto, que ele recuperou a dicção.

- Por que não me avisou? Existe mais alguma coisa para me dizer, sua louca?
- Não sou americana.



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