A vez do Nacionais

Por Jander Gomez

A literatura voltada para o público gay é extremamente rica, quando falamos de quantidade, tanto que muitas editoras decidiram apostar nesse segmento. Exemplo: Hoo Editora, Orgástica, Metanoia e Escândalo. A Galera Record, Rocco e Companhia das Letras, vez ou outra publica algum livro da temática. 

Mas vamos lá, existem no mercado editorial alguns títulos que merecem destaques no ambiente literário gay.  Não apenas por contarem uma história, mas por fazerem com que os leitores realmente sintam-se dentro delas, que reflitam, releiam, indiquem e compartilhem pelo simples prazer de fazê-los. Ou seja, por contarem uma boa história. Vou citar alguns: 

“Sobre garotos que beijam garotos” (Casa da palavra, 2015, 96p.) é do Youtuber Enrique Coimbra. Carioca que começou a despontar na rede com o blog “Discípulos de Peter Pan”. É autor de outros livros: Hereges da Santa Cruz e Um gay suicida em Shangri-la. Sobre Garotos que beijam garotos conta a história de Enzo, um menino que beija garotos, que não acredita em namoro e que sofre por se apaixonar por quem não se apaixona por ele. Essa atitude muda quando Ian, um jovem hétero demonstra interesse em Enzo e, a partir daí nasce em Enzo começa a ter por Ian alguns sentimentos diferentes. Ou será mais uma peça do destino? 

Aponto esse livro por um único motivo: É o retrato de uma geração queer. Os problemas, medos e sentimentos apresentados pelo autor, como a confusão, a distorção de sentimentos, e as palavras são nada mais que meros elementos sucintos a realidade dessa geração. É uma história curta, mas cativante e reflexiva até onde deseja ser. Teimosa quando deve e eloquente quando precisa.  

Outro destaque é o livro do Fernando Favaretto chamado "Ninguém me explicou na escola" (Editora Desfecho, 2014, 366p.). Eu li o livro quando estava de bem com a vida, mas se tivesse o lido quando estava na bad, com toda certeza teria ficado com muitos grilos na caraminhola. 

O livro tem bases reais dos diários do autor entre 1992 e 1994, quando ele era seminarista. Então desse prenúncio você já tem uma ideia de como será a história que traz muitos questionamentos em uma época que não havia tantos esclarecimentos sobre a homossexualidade. Eu sou desse tempo e posso dizer que muitas das dúvidas levantadas pelo autor atormentaram meus sonhos, como vou para o inferno, Deus me condena, o José da escola esta passando a mão na minha bunda, o que faço, fui tomar banho com os outros meninos e fiquei constrangido ou excitado, e por aí vai. 

Indico, pois é um livro que, como eu disse anteriormente, retrata uma geração totalmente diferente da que temos hoje e, vale dizer que todo conhecimento é válido. Ainda mais quando baseado em fatos reais. 

"Trilogia do desejo" de Roberto Muniz Dias (Editora Metanoia, 2015, 360p.), esse talvez seja o livro mais complexo dessa lista. O autor, Roberto Muniz Dias é exímio ao detalhar a alma do Ser Humano homossexual em seus desejos, medos, aflições e sonhos. Trilogia do desejo, apesar de ter esse nome, não é um livro sequencial, mas sim um compilado de trabalho do autor com seus três livros premiados, "Adeus a Aleto", "Um buquê improvisado" e "Urânios". Três histórias que fazem do leitor personagem, do narrador coadjuvante na lúcida tentativa de despertar o romantismo dentro de nós, leitores. 

Esse livro merece destaque pela forma como foi composto e pela linguagem que o autor trabalha. É um livro que você deve estar descansado, tranquilo e em paz para poder lê-lo. Um detalhe curioso é que a capa do livro foi criada pelo próprio autor. 

"O preço de ser diferente" (Editora Vida e consciência, 2005, 368p.) de Mônica Castro é de longe o livro mais querido de uma geração que teve o romantismo e as paixões homoafetivas correndo nas veias. É um livro espírita ditado por Leonel. Nele a autora estabelece uma narrativa singela, firme e apaixonante ao contar a história de Romero e o seu drama em se aceitar gay, o preconceito de seu pai, na escola e a perseguição sofrida por um ex-ficante. Esse foi o único livro que me fez chorar, no fim. 

A leitura vale pelo paralelo que o autor traça a espiritualidade com o mundo carnal, a forma como vemos nossos sonhos e nossas aflições terrenas. Diferente de "Ninguém me explicou na escola", que aborda temas polêmicos e deixa questões espirituais em aberto, "O preço de ser diferente" explica-as do ponto de vista Kardecista. Vale a pena ler. Sem contar que é uma história emocionante. 


"RE+começar" (Editora Kazuá, 2015, 280p.) de Jander Gomez.  Esse é o primeiro livro do autor que traz uma perspectiva diferente das histórias apresentadas. Nele é abordado temas como a homofobia, preconceito dentro de casa, amizade e o ápice do livro é o pós-morte. Digo pós-morte porque nessa história recheada de sentimentos latentes, o autor conta a historia de Roger, um rapaz que era casado com Renan e, por consequências da vida, Renan morre. O personagem então, viaja para a casa de sua mãe – que não sabe de sua homossexualidade – de férias do trabalho e lá, vai tentar se recuperar da morte do marido. E é nesse ponto que o livro ganha forças. Muitas histórias são recheadas de contos ficcionais e personagens exuberantes. Mas no livro de Jander Gomez, os personagens são reais. Sofrem dores reais. Risos reais. Situações reais.   

O livro vale ser lido por trazer reflexões sobre temas cotidianos e por ter quotes maravilhosos. A história é embasada em alguns fatos reais da vida do autor e é carregada de sentimentos. É um livro que pode ser lido em dois dias tranquilamente e sem dúvida, é emocionante. É uma leitura atual. 


"Risco de vida" (Editora Globo, 1995, 496p.) de Alberto Guzik é primordial para quem deseja viajar na cultura paulistana da década de 80, principalmente nos teatros, cafés e bares da época. Há também o submundo, onde gays se reuniam para seus encontros. Nesse livro maravilhoso, Alberto conta a história – não tão bonita, mas que foi vida de muitos gays da época – de Thomas, um professor e crítico de teatro que conhece Cláudio, um jovem confuso entre realidade e sonhos. Juntos, vão viver o amor de forma intensa e pulsante. 

A princípio esse livro não chama muito a atenção. Mas quando começamos a ler e mergulhar de verdade na história dos personagens, ficamos tão absortos do tempo que esquecemos completamente a vida que segue. Esse livro é importante para que possamos entender um pouco mais sobre o mal que assola o mundo – não só gay, como heterossexual também – que é a AIDS.  Sua leitura requer certo nível de concentração e empenho, pois em muitos momentos a personagem devaneia nas cenas de teatro da época e, sua escrita parece não ter fim. Em muitos momentos me perdi e tive que voltar algumas páginas, mas não me arrependo. 


E por fim, o clássico dos clássicos da literatura GAY datado de 1895, "Bom-crioulo" (Editora Atelie, 2014, 232p.) de Adolfo Caminha. É sem dúvida o primeiro livro da temática lançado pelas bandas de cá do mapa. Nele, além de trazer a riqueza de detalhes de uma época pós–escravatura e escravatura, era o nascimento, vida e morte do negro (Isso se ainda não o é em muitos lugares, inclusive aqui!) Amaro, personagem central do livro, para ser livre alista-se na marinha. Lá ele conhece Aleixo, um grumete por quem se apaixona. E desde então, sua vida muda. 
Não vou contar muito sobre esse livro, pois é um dos melhores livros da temática. 

A leitura de Adolfo Caminha, para quem conhecesse, pode ser prazerosa, rica e consistente, quanto cansativa e extenuante. A linguagem é culta e muitas vezes temos que recorrer ao famoso pai dos burros (Grifo meu). 

Ressalto-o por ser um livro clássico e histórico. Vale por conhecimento e por paixão. 

Para Eduardo Santarello da Secretaria de Direitos Humanos do Governo Federal, há um aumento nas publicações acadêmicas e jurídicas voltadas para o segmento GAY. “Antes tínhamos mais referencias consagradas porque eram poucos que produziam. Muita gente que produz hoje é na área acadêmica ou jurídica. Produção histórica, sobre a história da homossexualidade, por exemplo, ou história dos movimentos gay. Mas romances gay, comparado com o número de publicações editoriais mensais, ainda são pouquíssimos”. 

Vale ressaltar aqui que há muitos nomes no mercado que estão fazendo a mudança da literatura gay e literatura feminista. Essa lista contempla alguns poucos nomes e faz menção a autores em tempos e temas diferentes. Evidentemente nomes conceituados ficaram de fora como, Caio Fernando de Abreu, Rubem Fonseca (Meu ídolo-mór), José Silvério Trevisan, Herbert Daniel (De quem sou fãzaço) e muito mais. Mas oportunidades não faltaram para falar dos mestres. 

É importante ressaltar que quanto maior o número de livros no mercado que abordem essa temática, maior será o número de leitores e assim a informação chega àqueles que desconhecem a causa ou veem com pífias ideias da militância. O livro faz com que o leitor sinta as dores, desilusões, apatias, alegrias de um personagem e entenda um pouco do universo-arc0-íris. 

Fica aí a dica Kibook ! 

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4 comentários

Anônimo
25 de janeiro de 2016 às 14:01

Cadê "O terceiro travesseiro"?

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27 de janeiro de 2016 às 05:28

Também indico os vários títulos da Index e-Books (indexebooks.com) - é uma turminha de Portugal cujo único objetivo é divulgar tal literatura (por isso muitos títulos são grátis ou custam o equivalente a 1 dólar), tanto de autores de lá como de cá. Vendem pela Amazon, Livraria Cultura, Kobo...

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28 de janeiro de 2016 às 23:57

Não acredito que ainda não li o livro do Enrique hahah'

Eu comprei um box de um autor chamado David Levithan, ele escreveu um livro com o John Green (aquele do a culpa é das estrelas) e as temáticas são todas LGBT. Estou gostando bastante, só tinha lido um livro com essa temática antes e achei bem legal, vou anotar esses que você indicou

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2 de fevereiro de 2016 às 15:43

Muito boas as indicações, só "conhecia" o de Henrique que comprei recentemente mas ainda não li, os outros vou conferir o mais rápido possível pois A M O livros com essa temática.

Não é nacional mas Aristóteles e Dante Descobrem os Segrados do Universo - Benjamin Alire Saenz é MUITO lindo! Fica a dica <3

Abs

http://tediosoc.blogspot.com

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